segunda-feira, 4 de abril de 2011

O INQUÉRITO POLICIAL

Por Felipe Augusto Karam – Acadêmico de Direito da UniBrasil – Campus Curitiba/Tarumã

Antes de adentrar na seara do inquérito policial, importante explanar de forma sucinta acerca dos sistemas processuais existentes, quais sejam o sistema inquisitório, cujo princípio norteador é o inquisitivo, no qual a autoridade que conduz as apurações produz as provas ex-officio, ou seja, por arbitrariedade sem qualquer intervenção das partes; e o sistema acusatório, baseado no princípio dispositivo, no qual a produção das provas fica adstrita às partes que se contrapõem, sendo que a autoridade presidente não interfere de maneira efetiva na elaboração das provas, atendo-se exclusivamente em deferi-las ou não.

Entretanto, há uma figura híbrida no ordenamento jurídico brasileiro que permite, num primeiro momento, quando ainda não se forma o processo propriamente dito, uma fase pré-processual denominada de inquérito policial, no qual se desenrola pelo princípio inquisitivo, ou seja, pelo sistema inquisitório, não sendo facultado ao acusado participar da produção das provas, exceto delas se defender.

Posteriormente, com o término da persecução penal e conclusão pela denúncia do acusado, o processo se instaura pelo sistema acusatório. Tem-se, assim, um sistema denominado misto.

Este sistema misto tem sua origem com o movimento napoleônico, cujo nascimento se consolidou com o Code d’Instruction Criminelle (Código de Instrução Criminal) formado por duas fases, como temos no Brasil, sendo a primeira inquisitória e a segunda acusatória.

Na primeira fase denominada administrativa, qual seja, relativa ao inquérito policial, prevalece o sistema inquisitivo, como previsto no Código de Processo Penal - CPP entre os artigos 4º e 23º imperando como regra o sigilo dos atos pela polícia judiciária (art. 20º), com a finalidade principal de apurar as infrações penais e a sua autoria, colhendo as provas que servirem para o esclarecimento dos fatos e suas circunstâncias (art. 6º, III).

No conceito de sigilo, como previsto no artigo 20º do CPP, a sua determinação ocorrerá quando houver necessidade de elucidar os fatos ou quando houver interesse da sociedade e, na opinião do professor Jacinto COUTINHO, “significa dizer que dele será lançado mão quando a autoridade policial assim entender” (vide referencias), sendo certo que o sigilo poderá ser determinado a certos atos que possam ser prejudicados se forem divulgados de forma explícita, tais como uma escuta telefônica para interceptação de conversas.

Percebe-se que, neste exemplo, caso a autoridade dê ciência e publicidade ao ato que será praticado pela polícia judiciária, se tornará inócua sua diligência, pois, obviamente as partes investigadas não usarão dos meios de comunicação para continuar, em tese, com a prática do ato delituoso.

Entretanto, mister observar que, inexistindo tais situações, o sigilo integral e pleno, dado equivocadamente ao inquérito policial, não deve servir para mascarar os atos investigativos praticados e privar o indiciado da realização de sua defesa, desde a fase pré-processual em comento, ferindo o dispositivo constitucional da ampla defesa e contraditório (art. 5, XXXV, CR/88).

Se deverá, entretanto, permitir que o indiciado tome ciência dos atos de investigação já praticados, após sua conclusão, emitindo sua defesa tão logo seja possível.

O inquérito policial se forma com indícios de autoria e materialidade de um delito, com a finalidade específica de estabelecer a culpa, uma vez que um crime se define quando houver um fato humano típico que afronte o direito, dizendo-se antijurídico, cuja culpabilidade deve ser comprovada, sem possibilidade de se demonstrarem presentes hipóteses excludentes, tais como legitima defesa ou estado de necessidade.

A formação da culpa pode ser obtida através de diversos atos investigativos, exemplificados no exame de corpo de delito, inquirição de suspeitos e testemunhas, simulações, interceptações telefônicas, campanas e perseguições.

Porém, no caso de se utilizar de todos os aparatos policiais e das diligências determinadas, tanto pela autoridade policial quanto pela autoridade judiciária ou requeridas pelo Ministério Público, ainda assim não forem suficientes para a elucidação, bem como não houver caracterizada culpabilidade da pessoa do indiciado, se remeterão os autos de inquérito ao Ministério Público que requererá ao Juízo competente o seu arquivamento.

Tal procedimento faz coisa julgada formal e material, ou seja, não havendo provas da culpabilidade do indiciado, o mesmo não será submetido ao processo criminal, propriamente dito, bem como sobre esse não serão imputadas acusações, pois, carentes de fundamentação e comprovação, de modo que tão somente havendo novas provas, diga-se, diferentes das colhidas no inquérito policial, será possível desarquivar os autos de inquérito para uma denúncia.

Interessante observar que, muito embora o ato de arquivamento tenha uma aparência de ato administrativo, possui natureza de sentença judicial e, portanto, extintiva em relação à persecução penal contra a pessoa do acusado, posto que não houve provas suficientes para determinar a autoria e materialidade do crime perpetrado, em tese, pelo acusado.

Percebe-se pela leitura do artigo 28 do CPP que o juízo, ao receber o pedido de arquivamento pelo Ministério Público poderá se opor a esse, caso entenda improcedentes as razões aventadas pelo representante do parquet, momento em que remeterá os autos  de inquérito ao Procurador Geral que, por sua vez, após analisar o pedido, decidirá pela denúncia ou confirmação do arquivamento, do qual o juiz ficará adstrito à aceitação.

Em contrapartida, o Ministério Público poderá, convencido da autoria e materialidade do delito, oferecer denúncia da qual nascerá a ação penal, remetendo-se os autos de inquérito ao Juízo competente para recebimento.

Todas as provas produzidas no inquérito policial deverão ser refeitas perante o Juízo de Direito, para apreciação e decisão.

Há uma crítica severa da doutrina no que diz respeito às provas produzidas durante o procedimento policial, pois as mesmas servem ab initio para macular a imparcialidade do magistrado que, muito embora não tenha essa intenção, tece seu juízo de culpabilidade do acusado muito antes de determinar o cumprimento das diligências na fase processual.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. A Natureza Cautelar da Decisão de Arquivamento do Inquérito Policial. São Paulo: Revista Brasileira de Ciências Criminais Ano 18, nº 70, Abr. – Jun. 1993.

 _____ O Sigilo do Inquérito Policial e os Advogados: parecer. São Paulo: Revista Brasileira de Ciências Criminais Ano 5, nº 18, Abr. – Jun. 1997.


PITOMBO, Sérgio M. Moraes. Inquérito Policial: novas tendências. Belém: Centro de Estudos Jurídicos do Pará, 1986.